O “negócio mais lucrativo do mundo”, o tráfico de drogas, e a exploração de miseráveis, que fazem qualquer coisa por um trocado, ainda convivem na cracolândia.

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A região, no centro da cidade, que era frequentada por cerca de 600 viciados em crack por dia antes do início da operação policial para dispersá-los, movimentava R$ 1 milhão por mês com a venda da droga, segundo a polícia.

É um valor muito pequeno para um esquema que pode gerar ganhos de 900% desde a produção da cocaína (base para o crack) na Bolívia (principal fornecedora do Brasil) até o mercado europeu.

Segundo a polícia, um quilo de cocaína é comprado a R$ 7.000 na Bolívia e vendido pelo equivalente a R$ 69 mil na Espanha. Não há um dado exato sobre o Brasil.

Depois, a cocaína é partilhada, misturada, transformada ou não em crack e oferecida ao consumidor, num processo de multiplicação dos ganhos.

Mas os grandes favorecidos por esses lucros não são vistos nas ruas.

No ano passado, o Denarc (Departamento de Investigações sobre Narcóticos) prendeu 210 pessoas vendendo crack nas proximidades das ruas Helvétia e Guaianases, no coração da cracolândia.

A grande maioria foi considerada varejista, aquele que faz a ligação entre o produtor e o consumidor.

Danilo Verpa-9.jan.12/Folhapress
Policial militar de moto intimida usuários de crack na esquina das ruas Guaianazes e Aurora, no centro de SP
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CRACK SEM BARÃO

Também foram presos donos de laboratórios de refino e produção, mas a polícia não conseguiu estabelecer nenhuma conexão entre eles.

“Não encontramos um barão do crack. Quando é preso o dono de um laboratório, outro surge para suprir à demanda”, diz Wagner Giudice, que completa hoje um ano como diretor do Denarc.

Isso não significa que o tráfico seja coisa de pequenos ou amadores, apenas sua parte visível o é.

Segundo Giudice, a polícia sabe que existem até “sócios investidores”, pessoas que não querem se envolver diretamente com a droga, mas que financiam o negócio atraídos pela alta rentabilidade.

Maria Gorete Marques de Jesus, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, coordenou pesquisa, lançada em dezembro, com presos acusados de tráfico e identificou um perfil que revela pouca idade, baixa escolaridade e situação econômica difícil.

Alessandro Shinoda – 4.jan.12/Folhapress
Prédios que eram usados por dependentes na cracolândia ficam vazios; bairros vizinhos temem migração
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Foram analisados 923 casos. A maioria (54%) tinha de 18 a 29 anos e apenas o ensino fundamental (80%); 61% foram atendidos pela Defensoria Pública, por não poder pagar advogados.

“Falta investigação para saber quem de fato é o traficante em São Paulo. Esses presos são, muitas vezes, pessoas que repassam a droga para sustentar o próprio consumo”, afirma Gorete.

Relatos ouvidos na cracolândia dão conta da situação de outros miseráveis. Paulo Novaes, taxista que circula pela região, afirma que sempre é abordado por pessoas “enlouquecidas” pedindo dinheiro. “Outro dia, uma menina que aparentava ter 16 anos me pediu R$ 5. Disse que faria o que eu quisesse pelo dinheiro.”

R$ 5 é quanto custa uma pedra de crack.


VAGUINALDO MARINHEIRO
DE SÃO PAULO
FOLHA.COM