Vivo um momento de dor. Dor moral. Dor que surge da perplexidade diante dos rumos que a humanidade vem tomando. Grassa a violência e o desrespeito por toda à parte. É morte aqui, lá e em todo o lugar. Vive-se em clima de terror e medo. Nunca se sabe quem vai ser a próxima vítima de mãos impiedosas e intolerantes. Procuro meditar sobre as teorias psicológicas e suas explicações para certas atitudes humanas. Percebo, lamentavelmente, que a prática é muito diferente da teoria. Ela a submete com tal facilidade que surpreende até mesmo os teóricos que a criaram. Reformulações vão sendo feitas, no intuito de abarcar as modificações sempre crescentes; possibilidades infinitas como a singularidade humana.

Nesta era individualista que atravessamos poucos se importam em assegurar ao outro condições mínimas para se desenvolver com saúde e dignidade. A maioria preocupa-se somente consigo mesmo. A violência tem chocado porque assume proporções assustadoras e, por incrível que pareça, isso tem sido necessário para atingir uma série de corações endurecidos por tanto egocentrismo. E há quem diga: matou tem que matar! É por isso que vamos prosseguindo assim, de forma cada vez mais violenta. Não existe compaixão pelo próximo. Não existe amor! Milhares de crianças morrem de fome ao nosso lado. Milhares de pessoas precisam de uma oportunidade, um trabalho, uma chance na vida. Quantas vezes cerramos nossos ouvidos diante de apelos aflitos? Fechamos nossas mãos, nossos olhos e, por que não dizer, nossas carteiras diante da carência alheia? Preocupa-nos nossa própria mesa e a fartura que pode abrigar. Nem todos são tão pobres a ponto de nada terem para dividir. Muitos há que necessitam somente de uma palavra de encorajamento, mas alguém tem que dizê-la.

A omissão tem sido nosso maior pecado. Pecado social e moral que vem trazendo consequências desastrosas para todos nós. Deixamos de ajudar hoje, adubando a erva daninha que nos sufocará amanhã. Em minha profissão estou cansada de presenciar o nascimento de pequenos marginais que, com o tempo, transformam-se em grandes bandidos, alimentados pela exclusão, abandono, pouco caso, maus tratos e desamor. Faltam braços para acolher essa pequena criança quando ela mais precisa. Faltam conselheiros aos pais, orientadores nas dificuldades, apaziguadores nos momentos de tensão e desgaste. Enfim, faltam pessoas de bem querendo e se dispondo a ajudar. Têm medo de sujar as mãos. Enquanto isso o mal se espalha. Vários há que já não suportam; mas existem aqueles, e são muitos, que fingem nada ver ou sentir, somente para não ter o desconforto de arregaçar as mangas e fazer alguma coisa. Preferem a acomodação e o silêncio de quem checou a situação doméstica e, naquele dia, constatou todos em casa, saudáveis e sorridentes.

Gente, por favor, vamos acordar urgentemente antes que sejamos tragados por essa onda de violência. Não precisamos esperar ser os próximos ou alguém da nossa família. A família alheia é semelhante à nossa. Também chora e ri. Também paga impostos, batalha por uma vida melhor e tem direito à dignidade, respeito, saúde, amor, paz e segurança. Temos que contribuir para um mundo melhor. Temos que fazer a nossa parte e logo. Se exterminar bandidos fosse solução válida ao problema, a violência já não existiria em muitos países que, mesmo com menor índice de criminalidade, sobrevivem sob o domínio do medo, outra forma de coerção e violência. Somente através do amor poderemos vencer essa batalha. Solidariedade, compaixão, disponibilidade de ajuda e atenção ao próximo. Tenho certeza que, dessa forma, conseguiremos vencer a violência e alcançar a paz.

Maria Regina Canhos Vicentin (e.mail: contato@mariaregina.com.br) é escritora.