POR GUILHERME ALBAGLI DE ALMEIDA

Ao longo do tempo, o Homem preservou tanto a memória de fatos históricos, reais, dignos de serem lembrados pelo seu potencial educativo, quanto criou mitos nem sempre baseados na realidade, com a mesma finalidade didática. Alguns destes mitos são o do Narciso, da Torre de Babel e do Ícaro.

Narciso, contam as diferentes versões deste mito, foi um belo jovem extasiado pela sua própria beleza. Passou dias e dias ajoelhado à beira de um lago  se mirando sem nada comer ou beber. De inanição desmaiou, na água tombou e ali se afogou.

Outro relato que nos alerta aos perigos da exagerada autoconfiança encontramos no mito do Ícaro, ambicioso ao extremo de desejar voar próximo ao sol. Seu pai lhe fabricou asas artificiais e as colou às suas costas, mas com cera de abelha que, no meio do caminho, derreteu-se, soltando-lhe as asas, despencando-se  o jovem que espatifou-se ao chão.

Outro relato semelhante, desta vez meio verídico, é o caso da Torre de Babel, cujos construtores desejavam que chegasse às nuvens sem, contudo, calcularem bem a sua base de sustentação. Como Ícaro, a torre não resistiu e ruiu, estando os restos dos seus adobes ainda visíveis nas ruínas de Babilônia, no atual Iraque.

Se maneirassem a vaidade e a autoconfiança, Narciso poderia se admirar por muito mais tempo; Ícaro teria voltado da sua exploração e se, em vez da cera, usasse correias de couro para prender as suas asas, e a torre teria chegado mais alto se houvesse maior preocupação com a estabilidade da mesma, alargando convenientemente as suas partes mais baixas.

O desastre sócio-ambiental que destruiu 700 km de um rio brasileiro quase da sua nascente até mar adentro e que os engenheiros da mineradora responsável dizem “não saber o motivo”, me faz lembrar de imediato tais antigos mitos. 

Pouca barragem para muita lama residual da mineração a ser contida. Autoconfiança exagerada dos seus engenheiros. E vaidade exacerbada ao pensarem que tal barragem magrela conteria o contínuo depósito desta lama tóxica. Tão frágil era a contenção da represa que, logo após o desastre, prometeram mandar cinco mil caçambadas de terra para reforçar a base da barragem. Está aí a simples resposta da origem do desastre.

Vamos orar para que o Criador  amacie os nossos corações, minimizando o nosso narcisismo e a nossa megalomania. 

Voltemos a chamar a foz do Cachoeira pelo seu nome geograficamente correto. É ridículo chamar a foz do Cachoeira “Baía do Pontal“, por mais que amemos este pedaço do litoral brasileiro. Acho que nem a denominação “Enseada do Pontal” , com justiça, caberia neste caso. 

Nossos Tupinambá, muito sábios na construção da sua língua, a chamariam apenas Y-gua-pe, isto é: “lugar onde as águas se reúnem“. Chega de “Praia dos Milionários” e “Point dos Barões” pois milionários e barões verdadeiros devem estar mesmo pela Flórida ou pelo Caribe e não nas ruas e praias sujas da Zona Sul da Cidade

Há uns vinte anos, uma cozinheira capixaba abriu um restaurante popular noQuadrado de Trancoso. Tão pequeno era o espaço, com uma só porta de entrada, que a dona pôs o nome mais simples possível ao seu pequeno empreendimento: “A Portinha“, que hoje é um templo gastronômico com no minimo três endereços em três cidades. Outro exemplo: “A Biboca“, de um querido amigo que só fez crescer e reinvestir com a sua humilde biboca.

Vamos olhar para cima, para frente, mas com o olho também ao chão, pois ali estão buracos nos quais podemos tropeçar ou sermos de vez tragados por eles.