Comecemos com uma dúvida: um homem de idade, há muitos anos lutando contra o câncer, submetido a mais de dez operações, internado há uma quinzena por obstrução intestinal, sofre um infarto agudo. E não corre risco de vida? Torcer pela vitória do vice-presidente José Alencar sobre os males que o atingem é uma coisa; aceitar a prestação de informações inverossímeis é outra. Estaremos de volta aos tempos em que se falava de “sinais vitais preservados”?

Pois é: o vice-presidente José Alencar na UTI, com infarto agudo e suboclusão intestinal. O presidente Lula do outro lado do mundo, em Seul. O terceiro na linha da sucessão, Michel Temer, presidente da Câmara dos Deputados, em Buenos Aires. O quarto na linha de sucessão é o presidente do Senado, José Sarney.

Alguém ouviu algo sobre a posse de Sarney, nas horas (poucas, felizmente) em que dele seria a missão de presidir o país? Talvez não seja preciso tomar posse, formalmente. Alguém ouviu algo sobre os atos de Sarney como presidente?

Mas, afinal de contas, qual a importância disso? Mesmo na Coreia, o presidente Lula tinha acesso a todas as informações necessárias e condições para dar todas as ordens que quisesse. O que traz à tona a verdadeira questão: por que existe ainda toda uma estrutura de vices, caríssima, que hoje só serve para barganhar alianças, montada numa época em que as telecomunicações não existiam?

É um bom caminho para iniciar a reforma política: cortar o desnecessário, até a Vice-Presidência. E contar a verdade aos cidadãos, por desagradável que seja.

Quem nunca comeu melado

O presidente da Assembleia de São Paulo, Barros Munhoz, tomou posse no Governo, no lugar de Alberto Goldman, que viajou ao Japão. Sua primeira medida: viajou à cidade natal, Itapira, sua base eleitoral, para entregar verbas. Lembra Paes de Andrade, presidente da Câmara, que assumiu por 24 horas na ausência do presidente Itamar Franco: lotou um avião e foi à cidade natal, Mombaça, no Ceará, para mostrar a faixa aos eleitores. Se Itamar e Goldman pudessem legalmente governar à distância, estaríamos todos livres desse tipo de vexame.

De Cabeção a cabeção

Houve tempo em que Cabeção era um dos maiores goleiros do país: foi titular do Corinthians, tendo Gilmar na reserva, esteve na Seleção quando outros goleiros eram Gilmar, Castilho, Veludo, Barbosa. Por Cabeção não passava nada.

Hoje o cabeção é Fernando Haddad, o ministro da Educação que não consegue organizar direito sequer uma prova do Enem. Agora quer montar uma estrutura estatal para organizar concursos, incluindo até a Casa da Moeda. Só que isso já existe: as reclamações sobre concursos públicos federais são quase inexistentes. E, se o problema é gráfica, por que não a famosíssima Gráfica do Senado? Haddad, balançando os fartos cabelos, jogando charme nas entrevistas, já foi chamado de Fernando Vaidade. É muito: cabeção está bom. E por ele passa tudo.

Os enigmas do PanAmericano

O caso do Banco PanAmericano está longe de terminar. Primeiro, já há investigação das irregularidades: segundo, investigação das auditorias, que cobram caro para passar o pente-fino nas contas e tomaram a bola nas costas; terceiro, apuração das responsabilidades pessoais, não só no PanAmericano, mas na Caixa, nas auditorias, no banco que intermediou a venda de parte do capital. Se o esquema irregular era tão sofisticado que escapou a todas as apurações de praxe, quem terá sido o gênio que o criou? Se não era tão sofisticado, como passou?

A festa salarial

Os servidores do Judiciário querem 56% de aumento (o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, diz que o reajuste pedido “é delirante”). Dilma Rousseff disse que, se não houver aumento para os ministros, daqui a pouco ninguém vai querer ser ministro. Deputados querem equiparar seus salários aos dos ministros do Supremo (vai dar coisa próxima de 50%, se conseguirem).

Todos têm razão: ministro ganha muito pouco, o presidente da República recebe menos que qualquer executivo de empresa, os deputados, obrigados a ter pelo menos duas casas, desdobram-se em manobras pouco transparentes para ganhar mais, os servidores do Judiciário têm salários defasados. Em compensação, o Judiciário tem mais férias do que os outros poderes, muito mais férias que as empresas privadas. Ministros de Estado e deputados ganham pouco, mas seu número é excessivo: quase 40 Ministérios, mais de 500 deputados, e para que? E os gastos não se limitam a eles: todos têm multidões de assessores, motoristas, secretárias, terceirizados. Ministério não existe sem aquela caríssima placa com letras de latão polido; deputado não existe sem amplos gabinetes (tanto que o projeto original do Congresso já foi ampliado em sabe-se lá quantos prédios). Cada deputado ganha R$ 16 mil mensais, mais substanciais penduricalhos; o Tesouro gasta mais de R$ 100 mil mensais com cada uma de Suas Excelências.

As generosas cascatas

E, como os salários estaduais e municipais, são baseados nos federais, cada R$ 100 de aumento na Câmara significam mais R$ 75 em cada uma das 27 Assembleias, mais outro tanto em cada município. Não há Tesouro que aguente.