Todos os meios de comunicação têm prontinhos os necrológios de personalidades que, a seu ver, têm perspectivas mais próximas de livrar-se dos problemas da vida. De vez em quando acontece (e não é de hoje): já se divulgou o elogio fúnebre do escritor americano Mark Twain alguns anos antes de seu tempo regulamentar, já se divulgou o obituário do papa João Paulo 2º – o que motivou um dos mais notáveis desmentidos do rádio, “lamentamos informar que o papa não morreu”. Este colunista já escreveu há muito tempo uma meia dúzia de necrológios que, espera ardentemente, continuarão por muito tempo sem uso – e que, quando necessário, sejam utilizados no momento correto, e não antes dele.

Pois agora aconteceu com o senador José Sarney (PMDB-Amapá): alguém, inadvertidamente, liberou seu obituário. Bobagem perigosa: o homem é tão forte que, quando saiu uma notinha contra ele no Twitter de uma funcionária, ele disse que não se importava, que a moça deveria ser mantida no cargo, e ela foi demitida assim mesmo. Mas o melhor da história veio em seguida: o pessoal do Senado tucanou o obituário e passou a chamá-lo de “biografia” – o que, aliás, um obituário não deixa de ser. É claro que na biografia de alguém vivo se diz que ele “é” senador; num obituário, que ele “era”, “foi” senador. E os verbos da “biografia” estavam todos no pretérito, como se seus tempos já se tivessem passado.

Erraram da primeira vez. E tentaram corrigir o erro como é de hábito no país: buscando mascarar a verdade. Não dá: Sarney está vivo. Muitíssimo vivo.

Lobobão…

Este era o nome pelo qual o Willy Coyote dos desenhos americanos era conhecido antigamente no Brasil. Vivia perseguindo o Papa-Léguas, igualzinho certos antiquíssimos lobões perseguem cargos no Governo. Mas o Lobobão tinha uma vantagem sobre os primos lobões: era transparente. Queria caçar o Papa-Léguas e pronto – aliás, nem sabia o que era politicamente correto.

Ah, os Lobões de hoje! O ministro de Minas e Energia, Édison Lobão, enfrentou neste inicio de ano 14 grandes apagões (fora as luzes que já se desligam quando a meteorologia prevê a ocorrência de chuvas). Lobão garantiu mais uma vez que o sistema nacional de produção e distribuição de energia elétrica é moderno, confiável, robusto e seguro. Aliás, ele tem razão. Nos palácios onde circula jamais falta luz e o ar condicionado funciona com perfeição. Reclamar do quê?

…e o Papa-Cargos

Lobão começou a vida como jornalista. E subiu na vida quando se juntou à família Sarney. Lobão sabe o que é bom para a tosse: garantiu agora, por exemplo, que o senador Sarney não nomeou ninguém para o setor elétrico. “Não há qualquer diretor no sistema elétrico ou em agências reguladoras ligadas ao setor de energia que tenha sido indicado por Sarney”, diz. O problema dos Lobões é que, além dos grandes olhos que só enxergam o que querem, das grandes orelhas que só ouvem o que é conveniente, têm também uma boca de bom tamanho, onde cabe uma língua comprida demais. Este colunista poderia lembrar Flávio Decat, de Furnas, notoriamente indicado por Sarney. Mas prefere começar por cima: quem foi que indicou Édison Lobão para o Ministério?

Cheiros para quem gosta

A presidente Dilma Rousseff disse, no programa de Ana Maria Braga, que adora cheirar livros. Este colunista é do tempo em que a gente os lia.

Punir com classe

O ministro Paulo Medina, do Superior Tribunal de Justiça, foi compulsoriamente aposentado, acusado de venda de sentenças (o processo corre no Supremo Tribunal Federal, mas o Conselho Nacional de Justiça considerou que a aceitação da denúncia pelo STF, em si, era suficiente para torná-lo incompatível com o cargo). E que significa a aposentadoria compulsória? Significa que, sem necessidade de trabalhar, ele continua a receber o salário integral – o mesmo que receberia se estivesse trabalhando. Aliás, já faz algum tempo que Medina está proibido de trabalhar, mas recebe mesmo assim: desde agosto do ano passado, quando a decisão foi tomada. Agora, com a publicação, nada muda. A gente paga.

Para não esquecer

Lembra daquela promotora visivelmente alterada que atropelou uma jovem, no Rio, e continuou a prensá-la, até que a arrancaram do carro? E que não apenas se recusou a fazer dosagem alcoólica como foi liberada em seguida? A moça atropelada continua com sequelas (e morrendo de medo do que as autoridades possam fazer com ela). A promotora não foi presa. E aquele promotor que, guiando em alta velocidade na contramão, no Interior de São Paulo, matou uma família inteira? Foi punido: conseguiu ser transferido para a Capital, um posto disputadíssimo, equivalente a uma promoção. Mas não é sempre que carteirada funciona: aquele juiz que processou o porteiro do seu prédio porque não o chamava de “doutor” perdeu a ação. O porteiro não é obrigado a citar seus títulos.

Rei posto

A Academia Brasileira de Letras nem fez ainda a sessão em homenagem a Moacyr Scliar, que morreu há dias, e seu posto já é disputado a tapa. Que feio!