UMAS E OUTRAS INUSITADAS DA CIDADE ( XIII)
(NOTAS DE BELMONTE – ‘BEBEL’ PARA OS MAIS CHEGADOS)
Dizia-se em Bebel por ocasião da Grande Guerra que a suíça Abiah Reuter se comunicava com submarinos alemães na praia de Mogiquiçaba. Do término daquele conflito pra cá, lá se vão sessenta nove anos, mas, pelo visto, os germânicos não esqueceram essas bandas da Bahia, pois não hesitaram (tocamos neste assunto na parte IX) escolher –desta feita com salutares objetivos de se prepararem para uma Copa de Mundo–, a paradisíaca Santo Andre em Santa Cruz Cabrália, pertinho daquele distrito belmontense. Recordações que nos impulsionaram à continuidade do Umas e Outras… e, na de garimpo, encontrar outras visitas, se não de forma coletivas como as oriundas do país da Europa central, mas de duas celebridades, ou melhor: uma que viria a ser, outra já de fama consagrada.
Nizan Mansur de Carvalho Guanaes Gomes ou simplesmente Nizan Guanaes é o nome da fera que na década de 70 não perdia um período de férias de fim de ano em Bebel. A espontânea e inteligente extroversão valeu-lhe se enturmar facilmente com a rapaziada nativa. Participativo, estava “em todas”, inclusive como autor intelectual –como conta um de seus parceiros mais chegado, Cleber Menezes–, de uma trama para, juntamente com Pereirinha, Preto Edson, Paulinho Stolze, Elder Mansur Elias(observe o parentesco) surrupiar a “moqueca de robalo” que Balduino Borges (o Baduca) havia secretamente mandado preparar para uma lista de convidados. Como jogador, futebol não era sua praia, mas fora um entusiasta membro do Catuaba, agremiação formada pela estudantada local –e os de Salvador e Rio– para jogos de verão. ‘Bebemorar ganhando ou perdendo’, era o lema do time cujo ponto de concentração era o Bar da dona Waldir e Artur Paternostro, localizado quase em frente à Igreja de São Sebastião na praça assim também nomeada. Certa feita com a turma já “pra lá de Bagdá”, Nizan, de bermuda e sem camisa, não titubeia em adentrar o referido templo para tentar dialogar em latim com o pároco que rezava uma missa, deixando em pavorosa o beatério presente. Sim, foi um dedicado passista e, em parceria com Zé Carlos Stolze, como o próprio relata, letrista de um samba enredo –lembrado até hoje por ex-membros– para a Escola de Samba Mocidade Belmontense que outrora embelezava os carnavais da cidade. Foram ‘poucas e boas’ envolvendo o aludido, como salienta Cleber, mas impossível de inseri-las nas limitações de um breve texto.
Quem o conheceu nesse convívio de entretenimento da tenra idade, de cara deve ter imaginado que ali, pela precoce desenvoltura, estava em curso a eclosão de um gênio. E não deu outra, pois viria a ser um exemplo de genialidade no mundo da publicidade.
A outra figura a pintar pelas plagas de Bebel –no fim dos anos 80 se não estamos enganados– já era famoso. Trata-se de Turíbio Santos, outro gênio, um dos maiores violonista do planeta. E sua estadia tem tudo a ver com os belmontenses José Oswaldo Viana (conhecido como Bide), principalmente, e Rudival Melo, funcionários do Museu Villa-Lobos no Rio de Janeiro, onde Turíbio era diretor. Tornaram-se amigos, e na expansão da amizade os dois ao emergir das saudades, iam contando ao músico da pequena cidade sulbaiana. Transferidos para o IPHAN de Porto Seguro, receberam Turíbio acompanhado de sua esposa: viera pisar onde tudo começou. Só para conhecer, iria num bateu-voltou a Bebel. Qualé nada! Passara quinze dias! Agradou-lhe a hospitalidade local entre outras coisas.
Pelas mãos mágicas do artista, num violão arrumado de última hora, a música soou numa sublimidade tal que dava a impressão de um verdadeiro concerto. Inseparável das cordas, Turíbio fez questão de dedilhá-las na casa do amigo Bide, transformando-a, ao interpretar choros diversos e, claro, obras de Heitor Villa Lobos, em uma verdadeira sala de apresentação musical clássica para um público privilegiado. Ao terminar, com a simplicidade dos espíritos geniais, exclamou estar muito sóbrio e que, imitando os baianos, “estava na hora de tomar uma”.
Lembramos bem, como viajara de carro, de seu desejo de vir a Capitania dos Ilhéus e in loco conhecer a sua história. Meio sem jeito, meio constrangido e lamentando, dissemos-lhe não haver ligação rodoviária entre a Costa do Cacau e Costa do Desenvolvimento; que infelizmente a desta Costa findava em Bebel…
Publicamos, faz bom tempo, um escrito nos referindo a estas duas personagens. Como calhava com a série em curso, lembramos dele. Eliminando gorduras e contando com recentes e valiosas conversas, tidas com os belmontenses Zé Carlos Stolze, Cleber Menezes e Marcos Melo, testemunhais partícipes daqueles momentos, concluímos este XIII capítulo do ‘Umas e Outras…’
Heckel Januário