Luiz Castro em: DECOLORES
Par perfeito
BENTO CHIFRE DE CORNO MANSO PUBLICOU NA SEÇÃO DE CLASSIFICADOS do jornal da cidade onde passou a morar a menos de um mês, numa bela e estonteante mansão, com piscina aquecida, heliporto, quadra de esportes, campo de golfe, garagem com capacidade para cinco carros e outras comodidades da luxuria, o seguinte anúncio:
“Homem de cinquenta e nove anos alegre, simpático, de bem com a vida, sem historio médico em doenças contagiosas, próstata em dia, amarrado de paixão por mulher nova e bonita, após vários casamentos mal sucedidos e uma renca de filhos espalhados pelos quatro cantos do país, vem, através deste conceituado periódico, procurar uma jovem que seja meiga, dócil, sincera, extremamente carinhosa e honesta, para compromisso sério e duradouro. Exige, entretanto, que a interessada preencha alguns requisitos considerados essenciais a fim de que o entrosamento e o relacionamento sejam transparentes. É necessário observar a idade entre dezoito e trinta anos, não descartando, evidentemente, as que estiverem abaixo desse limite, porém, lembrando, terminantemente, fora de cogitação as que se encontrarem divorciadas dessa faixa etária. A mulher procurada deverá ter grau razoável de escolaridade para não cometer, em público, asneiras hediondas, ou vomitar, em lugares desapropriados, tolices, ou em conversas informais com amigos e parentes, sobre assuntos de anatomia, por exemplo, cair na besteira de afirmar, se perguntada, de que lado do corpo humano a vesícula está localizada, responder que o tal órgão fica situado do lado bilateral de dentro do estômago.
No mesmo norte, deve a futura consorte atentar para o uso vernacular correto, evitando sofrimentos auditivos a terceiros, como “de menas vezes”, “quando eu si casar”, “probrema”, “eu já si operei de apênis”, “é de grátis”, “vamos de a pé”, adoro tar com você” e outras tantas mancadas gramaticais imperdoáveis. Os olhos precisam ser totalmente azuis e que estejam sempre direcionados ao encontro do seu macho. Sobre os dentes, além de extremamente brancos e perfeitos, não podem apresentar cáries ou aparelhos correcionais. Exige que permaneçam dentro da boca vinte e quatro horas e, ao deitar, nunca dormirem mergulhados num copo de água com conservantes, soluções a base de formol, sal grosso, gengibre, limão e vinagre. Os seios, deverão ser pequenos e firmes, do tamanho de duas maçazinhas vermelhas e com os mamilos ligeiramente adocicados, preferencialmente voltados para as nuvens, como se quisessem tocá-las. Que ao menor roçar, mostrem o porvir, como se o amanhã ainda por nascer estivesse ao inteiro dispor, com muitos caminhos se abrindo à volta e, nunca passar a impressão de quererem escapar pelos dedos como água misturada com detergente. A boca e os lábios sem bafo ou cheiro de cigarro, devem possuir consistência macia, e, ao serem sugados, que a química da saliva se misture com a loucura dos beijos, e, ambos, nessa hora, viagem para um paraíso onde só o amor se faça presente e complete os dois de maneira a não deixar dúvidas. A barriguinha, se acaso existir, que seja discreta, atraente, pequena e não atue, em todo o conjunto, como um ponto de referência, tipo o Corcovado, no Rio de Janeiro, ou a Estátua de “Padim Ciço” em Juazeiro do Norte, no Ceará. A prioridade será dada àquela fêmea que for sexualmente explosiva em orgasmos contínuos. Se múltiplos, melhor. Todavia, se eventuais, que não deixe o parceiro perceber a frieza, nem passe, de forma alguma, a impressão, ou a sensação de serem forçados, estudados ou fingidos. Está liberado gemer durante o ato sexual, gritar enquanto ocorre a penetração, urrar, rebolar e até peidar. Não serão tolerados bocejos, risos, cara virada para o mostrador do rádio relógio, reclamações da música ambiente, da cerveja quente, das batatinhas pré-cozidas, dormir ou cochilar. Roncar ou babar está fora de cogitação de forma terminantemente fulminante. Terá preferência a donzela que não tenha feito nenhuma sessão de análise, o que poderia camuflar algum tipo de distúrbio psicológico, ou, até mesmo, uma eventual esquizofrenia mal curada. Se faz mister possuir um carro que ande, nem que seja um fusquinha. Essa moça deve carregar dinheiro na bolsa em quantidade suficiente para o motel, o almoço, o jantar e o táxi, uma vez que, pelo avançado da idade, lembrando, cinquenta e nove anos não existe aquela paciência dos tempos da juventude para sair de seu canto a fim de levar a preciosa, de madrugada, em casa, se sozinha morar, ou em residência dos pais, se com eles dividir o mesmo teto.
A interessada deverá enviar carta com fotos recentes, de corpo inteiro, frente, costas, lado direito e lado esquerdo, e vice-versa, bem ainda, de perfil, com destaques para as partes proibidas, sem ser prolixa acompanhada de um pequeno currículo vitae e uma cartinha escrita de próprio punho (no máximo 20 linhas), onde enumerará as experiências e o que sabe fazer para deixar um sujeito literalmente fora de controle e enlouquecido de prazer. Cartas à redação deste jornal, para o pseudônimo: (VELHO TARADO)”.
RESPOSTA DE UMA PRETENDENTE PUBLICADA DIAS APÓS NO MESMO ESPAÇO.
“Prezado Cavalheiro:
Li seu anuncio e publicamente venho manifestar meu particular interesse em manter um compromisso sério e duradouro com o senhor. Devo dizer, para início de conversa, que faço parte de tradicional família desta cidade. Acabei de completar dezenove anos, sou ainda virgem e intocada. Tive apenas um namoradinho que vinha em casa. Meus pais o adoravam. Só não demos continuidade ao romance, porque o desditoso nutria um ciúme doentio. Um sentimento mesquinho, exacerbado, sem fundamento, manifestamente posto a prova quando a gente saia, depois do almoço, para uma seção no cinema local, ou, ao término do filme, ao sentamos para comer uma pizza ou jantar no restaurante da pracinha, ou, ainda, as missas nas manhãs de domingo. Nessas oportunidades eu aproveitava para usar minhas roupas curtas, o que deixava meus dotes e dons divinos à mostra dos olhares afogueados e embasbacados de seus amigos. Meu ex-namorado odiava essas recepções e entrava em crise. Conclusão. Acabávamos a noite em veemente e trágica discussão.
Dessa forma, em vista do meu encanto por homens mais velhos, e, em especial por sua pessoa, também gostaria que o senhor cumprisse, à risca, outros “certos” requisitos que considero básicos e fundamentais para uma convivência ao aconchego de quatro paredes. Vale lembrar, que tais exigibilidades se baseiam em conclusões tiradas acerca do comportamento masculino, ou mais precisamente de meu pai (embora um cidadão com quase setenta janeiros), tem feito, até a data de hoje, mamãe passar por sérios aborrecimentos e transtornos, não culminando com uma separação em vista de problemas de ordens pessoais que, neste momento, são de somenos importância para o tema que trato nesta missiva. Em conseqüência dos percalços de minha mãe, evidentemente como filha única e atenta, sofro com ela e divido a sua dor. Essa “via crucis” só não deixou marcas profundas em minha formação e personalidade porque, graças a Deus, frequentei assiduamente um grupo de terapia, o que infelizmente faz séria oposição a uma de suas exigências. Ainda assim, convém ressaltar, que, no quesito pertinente a idade, espero que o senhor carregue a maturidade dos cinquenta e nove e, em contrapartida, o vigor e a robustez dos vinte, e que seu grau de escolaridade e conhecimentos gerais vá um pouco acolá da cultura adquirida através de novelas fúteis e programas de esportes. Seus olhos podem ser de qualquer cor, desde que vislumbrem algo além do futebol, jogos de cartas, de damas ou xadrez, com os amigos, em redor da piscina e revistas de mulheres peladas amontoadas no banheiro. Seus dentes devem sorrir mesmo quando lhe for solicitado, de vez em quando, ajudar a cuidar das louças do jantar, ou colocar as roupas sujas na máquina de lavar. Não faço questão que seus músculos tenham sido esculpidos por aparelhos de academia. Na verdade, quero olhar para o senhor e ver quem realmente é, e, jamais, confundi-lo, por exemplo, com o Arnold Schwarzenegger ou Bradd Pitt, ou qualquer outra figura renomada de Hollywood. Porém, seus braços necessitam ser fortes e suficientemente ágeis para me prenderem junto a seu corpo, me pegarem na cama e me fazerem submissa. Nesses momentos quero ser a sua empregada, sua amante e esposa. Pretendo receber leves e estudados tapinhas no rosto, na bundinha e, o mais importante, que suas mãos carreguem, sem esmorecer, as sacolas das compras do mês, quando formos, juntos, e, como dois pombinhos, ao supermercado.
Por motivos óbvios, a boca, além de cumprir com eficiência as funções a que está destinada no relacionamento de um casal, igualmente deve me lamber dos pés a cabeça, e, mais, pronunciar palavras doces e gentis e não somente frases do tipo “pega mais uma cerveja ai, mulher” ou “me traga uma toalha de banho, sua vagabunda de merda”. A barriguinha, que é quase certa o senhor a tenha, é tolerável, ainda que lembrada a picardia de estranhos, como vaga lembrança a do Laçador, em Porto Alegre, ou a estátua de Correia Pinto, em Lages, Santa Catarina, ou que via igual, não atrapalhe, na hora de se abaixar para pegar a cueca ou uma calcinha depois da nossa ralação, vez que, na afoiteza desses momentos mágicos, essas peças costumem parar nos lugares os mais estranhos, como atrás do frigobar, nas pás dos ventiladores de teto, ou em cima do suporte do aparelho de televisão. A respeito do desempenho sexual, espero que não haja aborrecimentos. Que no instante da alegria intensa corresponda, ao menos polidamente, à “performance” daquilo que o senhor propaga aos seus amigos o que diz fazer quando está com uma vagabunda nesses motéis de beira de estrada. Espero, sinceramente, que durante o ato sexual, o senhor não caia no sono, não ronque, não babe ou solte sonoros peidos. Norte idêntico, que eu não precise levar para a cama nenhum tipo de consolo para me excitar, ou algum livro nos moldes do “MANUAL DE COMO FAZER UMA MULHER JOVEM E BONITA SUBIR PELAS PAREDES” ou “1001 MANEIRAS DE INCENDIAR UMA GAROTA DE VINTE ANOS SEM COLOCAR FOGO NOS LENÇOIS, ambos de um escritor maluco chamado Aparecido Raimundo de Souza”.
Por assim, no que tange a alimentação, o senhor deverá andar nos bolsos com uma lista atualizada dos melhores restaurantes não só aqui da nossa cidade, como das redondezas. Ser um profundo conhecedor de vinhos e champanhes e, de roldão, distinguir todas as espécies de iguarias e pratos que possam agradar a uma jovem nessa faixa de idade que o senhor tanto almeja, além de ter cacife suficiente, na carteira, para bancar as contas das lojas, butiques e cabeleireiros onde eu possa freqüentar com certa assiduidade e me produzir para estar sempre apetitosa e desejável, como uma princesa saída dos livros de contos de fada. Por derradeiro, o carro se tornará uma peça desnecessária, até porque, os percursos durante a madrugada para me deixar em casa de meus pais, não acontecerão, uma vez que, havendo um entrosamento harmonioso e perfeito nas recomendações que trouxe à baila, pretendo, sem mais delongas, mudar, ato contínuo, de mala e cuia, para a sua suntuosa e cálida mansão.
Assinado: (GAROTA PORTA-NÍQUEIS)”.
Colaboração de Luiz Castro
Bacharel Administração de Empresa