Heckel Januário em: UMAS E OUTRAS INUSITADAS DA CIDADE (XIV)
(NOTAS DE BELMONTE – ‘BEBEL’ PARA OS MAIS CHEGADOS)
Esta é mais uma que não poderia faltar nesta série de Bebel; e dela participamos, porquanto colega –no extinto Banco da Bahia– do personagem principal, aliás, como o mais novo integrante –menor de idade e recém-chegado do Rio onde passara uma temporada na casa de parentes para estudar–, ingressando como ‘boy’(na base do pistolão, como se dizia, de Romildo Santana, antigo e conceituado funcionário deste banco, e filho de criação de um tio deste escrevinhador)no seu quadro funcional formado por Ernani Pinto(gerente), Octávio Marinho da Costa(chefe da contabilidade), Plinio Bandeira(caixa), Dominguinhos(boy), todos falecidos, mais Gilson Marques(conferente), morava em Salvador, e interrogamos o paradeiro, Nelson Paiva(diário), Luís Matos(conta corrente), estes com residências atuais respetivamente em Porto Seguro e Belmonte e, José Roberto Melo de Souza(cobrança), o protagonista pré-anunciado, atualmente morando em Canavieiras.
Ou simplesmente Zé Roberto, funcionário de comprovada competência e considerado um velocista nos teclados das antigas Remington e Olivetti. Apesar da fama de polêmico, de falador contumaz, à clientela atendia sempre com presteza e eficiência e com afáveis e calorosas “E aí fulano, o que mandas?”. Belo dia, um cliente desejoso de quitar uma duplicata da americana Pfizer Corporation (de produtos farmacêuticos), dirigiu-se ao balcão –na época era de praxe o ‘balcão de atendimento’ na arquitetura de bancos– e: “Zé, me quita aí uma da ‘faizer corporeichon’”. A pronúncia ‘faizer corporeichon’ claríssima não deixara a menor dúvida. Depois de acurada pesquisa na ‘éfe’ e nas demais letras do alfabeto do ‘arquivo’ –erado tipo sanfonado, de lona, de manuseável tamanho e por regra guardava-se no cofre–, Zé Roberto voltou-se para o cliente e dizendo-lhe nada haver da ‘faizer corporeichon’, pediu-lhe que voltasse no fim da semana seguinte, tempo suficiente do ‘malote bancário’ já ter chegado da capital baiana, a matriz da entidade bancaria. Com a certeza absoluta de o título estar vencido, o comerciante calculara juros, multa e outros encargos, tudo direitinho e, no dia previsto, cedão, já estava postado na agência para a quitação. Mas também com outra decisão em mente: a de mover uma ação contra o banco pelo prejuízo a ele causado, ‘danos morais’, como se costuma dizer hoje em dia.
Alheio a segunda intenção do sacado, Zé Roberto, educado e serelepe como de costume, foi logo: “Sinto muito, meu caro. Procurei tintim por tintim na papelada chegada de Salvador e da ‘faizer corporeichon’, ‘neca de pitibiriba’. E sem titubear completou: “Duplicatas mesmo, apenas quatro da ‘Pfizer Corporation’ as quais já cataloguei e juntei-as às que tenho arquivadas”. De voz grave e explicada –inclusive por essas qualidades, se dedicando posteriormente à locução em ‘serviços de autofalante’, e de rádios–, ‘pfizer’ e ‘corporation’, soaram claramente, com o ‘pfi-zer’ e ‘rartion’ acentuadíssimos. Mas aí, de súbito, o cliente saiu porta afora do banco, sem dar mais uma palavra.
E o caso foi realmente parar na Justiça. A tese de defesa –do Banco– se prendeu ao “purismo da língua”. Um dos argumentos, em resumo e grosso modo, pregara que em território brasileiro, a servidor algum –de qualquer instituição no país– pode ser negado o direito de aportuguesar vocábulo estrangeiros, esteja onde esteja inserido. E saiu-se vitoriosa. Ah, claro, a agência, era a de Bebel e se deu no início da década dos anos de 1960.
Tempos mais tardeZé conheceu Raimundo Elói, o Zundi, conhecido cidadão aqui da Capitania dos Ilhéus e que, quando nós nos deparamos na cidade, dele lembramos, e bem, assim nos credenciando inserir a personagem sem o artifício da inversão do nome para evitar desagrada-la, como fizemos em “Pura Expressão da Palavra”, escrito de igual tema de fevereiro de 2011. Além de, seguindoo princípio de que não existe ‘causo’ que se preze fiel à realidade, este tentar tão somente manter vivas essas memórias de Bebel.
—
Heckel Januário
Heckel,
Estou passando essa para o Zé Roberto que tem várias crônicas escritas sobre Belmonte, sempre com uma veia de humor, inclusive sobre meu avô Eliodoro Branco. A pasta com suas crônicas estão com Durval Filho e temos tido acesso a ela em contatos diários com o Zé.
TFA.’.
Tedesco.