Dia agitado. Tarefas domésticas comuns e permanentes. Caminhada e natação. Regozijo-me de usufruir de uma aposentadoria. Por mais de trinta e cinco anos trabalhei profissionalmente levando o melhor do meu conhecimento e experiência aos produtores rurais (pequenos, médios e grandes) e aos novos agrônomos na adoção de uma tecnologia agrícola capaz de aumentar a produtividade e renda econômica.

Com o corpo exausto, adormeci.  Adormeci e sonhei. Um sonho estranho.

Encontrava-me em uma cidade de tamanho médio, de clima tropical e ambiente demasiadamente tranquilo.  Casas novas, parecendo vilas proletárias, diferenciadas apenas pelas cores das paredes, mas, todas com a sigla ou lembrete informativo da ação do partido politico governamental.

As pessoas andavam tranquilamente; o transporte coletivo era gratuito, feito por ônibus velhos, deteriorados e com imagens elogiosas às personagens do governo.  O comercio com suas lojas grandes, ostentando produtos padronizados, sem qualquer campanha de promoções ou de “descontos”. Os pagamentos das compras eram feitos com a apresentação do Cartão Governamental de Identificação e o valor subtraído nas diferentes “Bolsas” recebidas do Governo por doação.

As poucas indústrias produziam sem muita agitação os objetos e os bens básicos e necessários às famílias. Todos do mesmo modelo – geladeiras, fogões, T V, rádios e o vestuário, sem qualquer sofisticação; os móveis das casas variavam de tamanho devido ao número de pessoas na família.

A assistência médica padronizada, feita ao modelo “cubano”. Ainda existindo “partos” de gestantes, em condição crítica, dando à luz a crianças nas portas do hospital deficiente e mal administrado. As aglomerações de enfermos eram constantes nos corredores do hospital; sem qualquer assistência, conformados, aguardavam a proximidade da morte.

Na praça, ouvi os cantos de crianças na porta de sua escola; estavam elevando a bandeira e seus cânticos eram do MST (movimento sem terra). Disciplinadas e condicionadas como pequenos robôs. Lembrei do que tinha lido em uma revista.

As terras para a produção agrícola ou pecuária estavam em pequenos lotes e entregues a correligionários ou homens sem tradição com a faina agrícola. A produtividade era baixa nas poucas plantações; muitos tinham vendido os seus lotes e os atuais donos estavam ausentes quase que permanentemente.

Havia uma “Universidade para Todos”, mas, os alunos não podiam pensar discutir e contrariar as normas e a metodologia educativa. Professores treinados no exterior, precisamente em Cuba. Venezuela e mesmo na antiga União Soviética com metodologia de indução e doutrinamento da filosofia e princípios socialistas na formação dos futuros “companheiros”. Os poucos jornais e emissoras de rádio eram dirigidos pelo governo e seu alcance era somente a população nacional. As noticias eram sempre de resultados positivos, animando os leitores para o sistema existente: sem aspirações financeiras, sem ambições promocionais ou acadêmicas quanto mais, querer conhecer outros lugares do chamado “mundo capitalista”.

Somente os dirigentes, chefes ou líderes políticos tinham direito a ter habitações e transporte diferentes, não padronizadas e com moveis e utensílios importados do exterior; seus rendimentos financeiros ocultos, pois representavam problemas de segurança nacional; o grupo se identificava como “correligionário” ou “companheiro”, membros do movimento proletariado socialista.

Parecia o “Mundo da Paz”. Como se tudo já estivesse resolvido. Ideia utópica para um grande país, cheio de riquezas naturais e necessidade de explorar suas terras, suas florestas, seus campos com sua gente alegre e feliz.  Era um dia de trabalho, nada de feriado ou domingo; sem qualquer gritaria rebelde, travessuras infantis ou movimentos populares contra a ordem ou o sistema político existente.

Corri pelas ruas em busca de um lugar onde pudesse abrir os olhos e cair na realidade da vida; a principio imaginei estar no Brasil. Reconheci alguns aspectos comuns e semelhantes, identifiquei lideres políticos atuantes. Projetos e planos idealizados e na tentativa de torná-los reais. O perigo que ainda existe.

Acordei de fato.  Estou no “Mundo Real”; nada de utopia e de pensamentos estranhos. Queria voltar ao meu mundo, mesmo com as dificuldades existentes; elas, inspiram a minha criatividade na procura de soluções. Um mundo dependente de coisas, objetos e amores, mas que seus próprios donos têm a liberdade de escolher e não, impostas pelo governo.

Quero viver em uma sociedade que luta, compete com lealdade, que aspira por algo melhor e trabalha para alcançar este objetivo.  Sociedade com gente livre, que pensa, sente, sofre, curte alegrias e reage contra injustiças.

Sociedade com gente que SONHA E TRABALHA!

Jorge Raymundo Vieira

Ilhéus, Bahia –  20-12-2013