De: Hepaminondas Batráquio de Jesus.
Assunto: A Questão Humana num Consultório Sentimental Contemporâneo.

Corpo da mensagem:
A Questão Humana num Consultório Sentimental Contemporâneo.

Prezada Márcia Goldschmidt!

Ainda ontem levei minha namorada para comer lá em casa. Como sempre, foram momentos inesquecíveis aqueles desfrutados com ela. Eu havia lhe preparado uma deliciosa moqueca de manjuba; feita no capricho. Ela adora manjuba! Um bom vinho Borgonha e música suave na digestão pós-prandial que fizemos sentados na varanda, falando de amor e do nosso relacionamento que vai às mil maravilhas.

Sempre que tenho um tempinho, faço questão de trazer a Claudimeyre pra comer aqui em casa. Ela tem um restaurante lá na Rodoviária e, pelo que me disse, anda enjoada da própria comida; por isso adora variar uma comida fora. Eu me esmero pra agradá-la, afinal, essa vai ser minha companheira; tenho planos de futuro junto com ela. Contudo venho enfrentando um enorme dilema e o medo da nossa relação deteriorar para separação, se ela não encarar com normalidade alguns aspectos típicos da minha família. Aliás, nada demais.

Recorro a você para pedir conselho num dilema muito sério. A sua experiência no trato desses assuntos será primordial para garantir a permanência da Claudimeyre ao mau lado.

Ela é a namorada que eu amo intensamente e quero casar com ela. O meu problema tem a ver com a minha família. Eu tenho receio que a minha gata não se identifique com o “conjunto” e isso gere conflitos em nosso relacionamento. Ainda ontem estávamos conversando sobre nosso futuro, quando ela me saiu com este provérbio: “É mais fácil um corno manso; um veado ou um ladrão passar pelo buraquinho do cu de uma agulha, que um político falar a verdade”. Por isso o meu temor. Vamos aos fatos.

Papai é chefe do tráfico e tem atuação muito forte aqui no Rio. Ele conheceu a minha mãe numa casa de tolerância e conseguiu tirá-la dessa vida. Hoje ela tem sua própria casa na zona com mais de duzentas mulheres e homens, e não precisa mais exercer esse trabalho pessoalmente, só de vez em quando pra se manter sempre por dentro das tendências do mercado.

Tenho três irmãos e duas irmãs que eu conheço pessoalmente. O mais velho é deputado federal. O segundo tinha problema, mas mudou muito a vida depois que cumpriu a pena por sequestro e estupro, e hoje é bispo da Igreja Universal da Glória de Jesus. Já ressuscitou mais de catorze mortos, curou mais de 3.000 aidéticos e vive hoje bem com a graça de Deus com suas quatro esposas em Jurerê Internacional.

Meu terceiro irmão abandonou a milícia que ele comandava no Complexo do Alemão; se arrependeu dos presuntos que ele tem no currículo. Saiu do armário faz uns oito meses e hoje é travesti e trabalha na Rua do Jóquei em São Paulo, mas ele faz só ativo. Apesar de ter virado a casaca e largado o Mengão pra virar corintiano por causa do Ronaldo, ele é um menino bom e não causa preocupação na família. A gente vê que ele tá bem encaminhado.

A minha irmã mais velha casou com o avô da ex-namorada dela, que está em estado vegetativo por causa de um derrame que ele teve quando o bicho pegou na época do mensalão. Ela abriu sua própria empresa em parceria com um sindicato, um despachante e um cartório, e hoje vende autopeças procedentes de veículos desaparecidos de outros Estados. E a minha irmã caçulinha trabalha de dia como atriz nas Brasileirinhas e de noite ajuda a mamãe, só que ainda na fase do atendimento direto ao cliente, pra poder pegar o know-how do negócio a partir da base.

Pra completar; ainda tenho duas meias-irmãs produto das horas-extras de papai lá na Lapa. Elas estão atuando lá pras bandas do Sul da Bahia. A Nini maçaneta presta serviço numa Secretaria Municipal de Saúde e à noite é Cuidadora de adolescentes; a Valderês está numa Secretaria de Assistência Social. Ambas já compraram apartamentos na capital e algumas propriedades agrícolas. Iam muito bem, mas telefonaram ontem solicitando a indicação de um bom advogado criminalista. Acho que não deve ser nada não. Elas sempre gostaram de advogados e aí é diferente daqui, onde vez em quando o bicho pega feio.

Bom, Márcia, a minha pergunta é a seguinte: você acha que eu devo revelar de uma vez ou ir revelando pouco a pouco à minha namorada que eu tenho um irmão deputado e duas meias-irmãs em Cargos de Confiança?

Ajuda aí vai Márcia! estou bum dilema danado!

Hepaminondas Batráquio de Jesus.
Seu fã!!!


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