Transcrito do Ilhéus Jornal de 1º de fevereiro de 1940
Henrique Alves dos Reis
Um chefe, um homem, um exemplo

Forte, intrépido, valoroso, sonhando com a riqueza da gleba fecunda onde a alma inquieta pudesse encontrar um ponto seguro de fixação, alguns lustros já decorridos, foi empreendida uma viagem, cuja significação é rememorada, hoje, como justiça ao viajor intemerato que se chamou Henrique Alves dos Reis.

Partindo de São Jorge dos Ilhéus, seu torrão natal, na excursão do plano que se traçara de devassar os encantos da natureza quase virgem e esplendorosa, subira o < < Cachoeira >>, soberbo e imponente, à busca da terra imatura, onde medrassem as suas benfazejas intenções de homem realizador e dinâmico.

Fascinado pelas sombras das árvores seculares, que se refletiam nas bordas da superfície calma, varada pelas rítmicas remadas do velho canoeiro, contemplando a paisagem encantadora e sempre nova, o viajante alcançara o próspero comércio do Banco da Vitória; ali estavam, aquele tempo, José Vitorino, Pedro Simas, Ernestino Guerra, Manoel Tabinha, Ulisses Sá, Fernando Steiger, constituindo com outros muitos a classe laboriosa do mais importante e rico centro comercial de seu tempo; passados alguns momentos entre a gente modesta e amiga do Banco, o itinerante audaz rumara, seguindo o curso do rio, cavalgando boa alimária, à procura do centro ainda por desbravar quase todo, passando pela fazenda < < Bom Gosto >> do velho Albino Martins, até encontrar o afamado lugarejo do < < Empata Viagem >>, adiante contornando e vencendo os perigos do < < Cais >>, atravessando as propriedades de Diogo Salomônio Câmara, Manoel Geraldo, a casaria do < < Salobrinho >>, mais alem, as sesmarias onde os Berbert deixaram tradições heráldicas, interrompida a marcha do bandeirante para deter-se na < < ILHA DOS QUERICÓS >>, em sua casa grande da < < Sempre Viva >>, onde a infância e a juventude plasmaram, < < na blindagem viva do domínio rural >>, a cristalinidade e a independência de caráter do lutador corajoso e íntegro.

O seu sonho obrigaria, entretanto, a nova caminhada, ainda em direção do centro, percorrendo o < < Recheado >>, a propriedade do Domingos Fernandes, até encontrar o povoado das < < Tabocas >>, assim denominado pelos alardes festivos de Manoel Mornão e filhos, nas derrubadas de imponentes jequitibás. Desde então exercia-se, estabilizadora e desinteressada, a sua influência na formação do futuroso arraial.

Estava, porem, reservado a < < Tabocas >> o destino de se tornar, singularmente, um poderoso e radiante núcleo de civilização, graças à consciência clara e vibrátil de seus primeiros habitantes, da direção, da cooperação social, da tenacidade e do comando seguro de seus plasmadores, entre os quais convêm salientadas, em primeiro plano, as figuras de Henrique Alves dos Reis, Firmino Alves, entre muitos outros, que argamassaram os alicerces básicos e estruturais da grandiosa Itabuna de nossos dias.

E o homem desaparecido ontem teve relevo notável na tarefa estupenda de civilizar a terra misteriosa e boa. Contribuiu, fortemente, para a elevação do próspero arraial, à vila, em 13 de setembro de 1906, e, bem assim, para que, em 28 de julho de 1910, fosse alcançada a categoria de cidade autônoma e livre. Teve ele atuação destacada na política, respeitado pelos adversários, exercendo fora das lides municipais sua influencia, prestigiado, governando os destinos da coletividade com rara visão e largo descortino, desinteressado e intransigente em seus princípios normativos, leal, digno, bravo e honrado. Esse homem < < cujo coração não envelheceu >>, batendo em admirável e impressionante sincronismo com as aspirações da terra que lhe guarda, hoje, o corpo, jamais notara indiferença d’alma nos momentos históricos de sua formação, exercendo, até a hora extrema, a vigilância serena e ponderada de sempre para estímulo e exemplo dos continuadores de sua missão, lutando e trabalhando em constante e permanente emoção pelos nossos mais transcendentais problemas, Henrique Alves dos Reis continuará a velar e orientar os destinos de Itabuna.

Porque o exemplo que nos foi legado por esse itabunense, e itabunense pelo mais incontestável dos títulos, servirá como paradigma de devotamento e de amizade às gerações porvindoras.

Realizada, nobremente, a sua tarefa, até o fim, ele soube morrer sem fraqueza ou desalento, cristãmente, < < no meio daqueles entre os quais viveu e combateu >>. Do < < Intransigente >> de 27 de janeiro de 1940.