Jorge Raymundo Vieira

Ontem assisti no Festival de Cinema – Bahia 2 – no Cine Teatro de Ilhéus à exposição do Documentário “O NÓ – Ato Humano Deliberado” do cineasta.
Belíssima apresentação. Parabéns pela arte, pela forma de expor o tema, pela filmagem e em especial, pela coragem de dar à sociedade do cacau o conhecimento real desse trágico e desastroso episódio, provocado pelo ser humano regional.
Até então, parecia que a região estava esquecida, ou melhor, tinha aceitado o desastre pacificamente e perdoado o ou os grandes responsáveis. Passado o tempo, as conversas, as revoltas dos produtores amenizaram-se e os órgãos governamentais pareciam ter apagado o episódio arquivando o processo existente.
Surge esse documentário. Ele retrata com detalhes o ocorrido, os sofrimentos dos produtores e dos trabalhadores do cacau. O reflexo no comercio regional, e na vida social e econômica da população.
Parabéns aos idealizadores desse documentário cinematográfico. Estão gravados os fatos, os depoimentos até a confissão de um dos executores do crime. Material comprobatório de todo o episódio, permitindo “ainda” uma atitude governamental e da justiça, reparando as perdas financeiras dos produtores pelo desastre ocorrido e das orientações técnicas precipitadas sem uma comprovação cientifica significante e a necessária punição aos criminosos.
Um deles se identificou confessando sua ação maldosa. Existiram outros? Quem liderou ou foi o mandante do crime? Quem encoberta todo esta tragédia regional ocultando provas e arquivando o processo policial?
Tudo isto representa um triste acontecimento nesta bela e rica região do sul da Bahia. Certamente vai ficar somente na história e futuros “Jorge Amado” vão escrever sobre este tema.

O que para mim faltou no documentário.

Ficou nas imagens, em alguns depoimentos e outros expostos posteriormente a impressão de que a maior culpa estava na Ceplac. Alguns entrevistados condenaram mais a instituição que os introdutores da Vassoura de Bruxa na região. Na verdade foram inúmeras tentativas técnicas no desejo de reter o avanço da enfermidade ou mesmo combatê-la eficientemente. Provavelmente a ansiedade deste desejo e a carência de pesquisas existentes levaram a agilizar soluções sem o devido tempo de comprovação cientifica. Mas, precisava-se fazer algo; tentar a todo custo salvar as plantações de cacau e sua economia deste desastre provocado pelo ser humano.
O áureo tempo da instituição foi esquecido. Nos anos 50 e inicio de 60 existiu uma grande crise na lavoura cacaueira levando muitos cacauicultores a falência. Queda da produção, baixa produtividade causada pela Podridão Parda, falta de organização da classe produtora, preços baixos, comercialização inadequada, ampliação dos débitos financeiros e falta de atendimento governamental.
Em 1957 por sugestão dos produtores de cacau surgiu a CEPLAC hoje tão condenada. Foi ela que tirou a maioria dos produtores da falência e da perda de suas propriedades agrícolas através de financiamentos apropriados. Depois foi ela quem deu inicio a um Programa Técnico especialmente dedicado ao Cacau.
A Bahia e o Brasil não possuíam mais que cinco ou seis técnicos de reconhecida experiência e conhecimento no cultivo do cacau. Na comercialização do produto nem se fala. Estava com os exportadores. Foi preciso contratar técnicos recém-formados e ensinar-lhes sobre este cultivo em todos seus aspectos e injetar uma dosagem de idealismo com o desejo de retirar a região desta triste situação.
E hoje poucos sabem que a Ceplac nos seus primeiros vinte e cinco anos de existência, além de vários benefícios prestados à região, conseguiu aumentar a produção brasileira de 120.000 toneladas para 420.000 ton.

de cacau; resultado do trabalho técnico científico, da assistência técnica e da participação e dedicação dos produtores. Período áureo para os produtores. Representou também um modelo institucional para a criação da EMBRAPA.
A história está aí registrando não só os erros e falhas, mas também os sucessos e a influencia benéfica exercida em prol do desenvolvimento socioeconômico da região.
Todo este êxito gerado pela Ceplac e produtores de cacau poderia ter continuado se não fossem alguns fatos ocorridos no âmbito governamental: a extinção da Cota de Contribuição Cambial – exigência de uma nova política monetária – restringindo recursos da Ceplac e tirando sua independência administrativa financeira.
Outro aspecto foi à introdução da política partidária na sua administração, variando de partidos, do governo Sarney até hoje através dos políticos regionais e seus interesses eleitoreiros. O terceiro grande problema, toda a sociedade tem conhecimento – a introdução maldosa da Vassoura de Bruxa.
A região está sem uma forte organização dos produtores, sem representação política competente e descomprometida, sem reação da sociedade regional na defesa desta economia, sem o Governo atender as reivindicações dos produtores e deixando a CEPLAC à “míngua” – escassez de recursos, sem atualização técnica dos seus profissionais e especialmente sem reposição do seu quadro de técnicos a mais de 15 anos promovendo um descontentamento generalizado e ainda vivendo influenciada pela política partidária de interesse eleitoral.
Espero e almejo que esse Documentário Cinematográfico permita a revitalização das ações dos produtores de cacau e a reabertura do processo criminal, estranhamente arquivado.

Jorge Raymundo Vieira. Eng. Agrônomo, MS aposentado da CEPLAC.