(NOTAS DE BELMONTE – ‘BEBEL’ PARA OS MAIS CHEGADOS)

O vapor ancorara pertinho da boca do Jequitinhonha, local onde, de acordo a empresa pública brasileira CPRM- Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais, e como fora relatado em Umas e Outras (III), existe uma mina submersa de diamantes.

Disse-se ainda de viajantes que ao desbravarem o rio, muito contribuíram com seus registros para a história do Brasil, a exemplo do príncipe germânico Maximiliano Wied-Neuwied que o adentrou partindo da foz.

Foz essa que, Tupã-Cavalo, o “centauro”, o “bicho mondrongo”, certa vez, vindo do mar, penetrara e, ao casar-se com a “Mãe d’água” (a “iara do Jequitinhonha”), gesta Iararana, esplendido poema narrativo de Sosígenes Costa. Nascimento obviamente impossível se o Jequitinhonha não fosse visto com um olhar diferente, um olhar de poeta, grandioso, sobretudo. Diferentemente também da visão mais econômica dos primeiros viajantes, o viu Zanine Caldas, outro belmontense e artista plástico de variadas facetas encontrando na mata a musa inspiradora. Exaltando as origens, essenciais no desenvolvimento do dom e da inspiração do mestre, Zanine em 1987, de Paris, num de seus artigos para jornais, inseria o excerto: “Nasci em Belmonte, no sul da Bahia, que era rodeada de grandes florestas há setenta anos. Nunca pensei em ser arquiteto. Cresci fascinado com gente que faz coisas. Que transforma árvore em mesas, cadeiras, colheres de pau, portas, janela e gamelas, panos em roupas, couros em sapatos, plantas em comida, papel e tinta em desenhos e poemas”. Tornou-se famoso, e por motivos óbvios ficara conhecido como o “Mago da Madeira”.

Era uma época de um Jequitinhonha caudaloso; suas enchentes atemorizavam a comunidade ribeirinha, mas logo o solo de aluvião fazia advir-lhe a bonança. O cenário, com “tropeiros” e “canoeiros” em destaque, singularizava no contexto cultural da Civilização do Cacau: a Zona Cacaueira do Jequitinhonha. No cais belmontense chegaram a aportar barcos e navios de ferro de consideráveis calados no transporte de passageiros e cargas, especialmente as dos “frutos de ouro” destinados a Ilhéus e Salvador.  A movimentação efervescente do porto ditava o comércio da cidade. As amerissagens dos Junkers W-34 e JU-52, aviões d’água de 5 e 19 passageiros respectivamente da empresa Syndicato Condor Ltda., servindo-se  do rio em escala regular na ligação Salvador/Rio e vice-versa. (dados extraídos de Tabu -1ª quinzena de julho e 2ª de agosto de 96, e de A Tarde de 23/8/1992) são mais evidências de sua importância. Mas eis que a voracidade capitalista por maiores lucros empreende uma continuada devastação da mata ribeirinha. Daí em diante só restou ao Baixo Jequitinhonha, assim como se fossem coisas moderninhas do progresso, um assoreamento progressivo, entre outras consequências, como o afetar de sua piscosidade. Efeitos esses ‘coadjuvados’ pela Hidroelétrica Itapebi operando desde 2003 (no Alto Jequitinhonha a de Irapé nos  municípios de Grão Mogol e Berilo em Minas Geraisfora inaugurada em 2006).

O mais incrível é que antes as cheias, embora não se pudesse impedi-las, eram previsíveis. À ameaça, o brado de “o cacau tá caindo nas cabeceiras”, sinalizando chuvas nas nascentes da bacia, o margeava e, condicionava uma possível prevenção. Obedecia-se, claro, à mãe natureza. Hoje em dia é por isso que se diz que em Bebel acontece cada uma de Deus duvidar! –, veja você! pois não é que com todo o secamento do rio, as enchentes persistem e são de arrombar! Só que agora em vez de surgirem de modo natural, elas têm o dedo do bicho-homem: quando a Usina de Itapebí resolve sem um alertazinha sequer soltar suas águas, deixando em polvorosa a vida ribeirinha e citadina.  Alô, alô pessoal da Hidroelétrica: avisa, avisa. Viu aí como em Bebel até a negligência se torna inusitada? Bom, ainda bem que a maré alta permitirá a embarcação prosseguir viagem sem a interferência implacável do duo natureza/homem.

                                                                                  Heckel Januário

Para ler a PARTE III clique AQUI