Anísio Cruz – março 2018

Eu não estava a fim de opinar acerca do assassinato da Mirella, militante carioca que tem causado muita celeuma entre as correntes políticas antagônicas que dominam o cenário brasileiro. Não quero polemizar a respeito, pois entendo que, por detrás da política, de inegável competência, há um ser humano, mulher, que precisa ser respeitado, após a sua trágica morte, executada que foi. Entendo que o seu posicionamento, enquanto líder comunitária, a fez angariar amigos, correligionários, e também inimigos, que tinham todos os motivos para apagar a sua voz. E o fizeram.

Ela transitava perigosamente, entre diversos segmentos da vida carioca, que ia da política partidária, que a elegeu vereadora, com cerca de 46 mil votos, passando também por grupos LGBTs, dentre outros. Carismática, criou em torno de si, um séquito de moradores da favela em que morava, e também de outras comunidades, nas quais era uma voz atuante em defesa das minorias. Negra, jovem, e bonita, chamava a si a atenção dos holofotes e da mídia, ávida pela criação de mitos. Socióloga, por formação, também transitava com desenvoltura nos segmentos acadêmicos do Rio de Janeiro. Era incansável nesse mister, e a impressão que temos, é que o seu dia possuía muito mais que as 24 horas naturais, que todos vivenciamos, nos ajustando para cumprir as nossas agendas diárias.

A comoção, e a revolta que a sua prematura morte provocou, entre as correntes de militância, nas quais atuava, ocasionando protestos em todo o território nacional, e chegando à mídia internacional, como um rastilho de pólvora. Todos exigindo a apuração dos fatos, a identificação dos culpados, para que sejam levados às barras dos tribunais, o quanto antes, servindo de exemplo aos se julgam com o poder de eliminar seus desafetos, sem o menor temor aos ditames da lei. Esperamos que assim seja feito, pois os  efeitos devastadores da impunidade, todos já conhecemos. Que o diga os familiares do Celso Daniel, do Eduardo Campos, do Toninho do PT, e de centenas de policiais que também são executados, pelas ruas do Brasil. Juntemos a eles, os inúmeros casos de assassinatos que ocorrem diariamente, contribuindo estatisticamente, para nos colocar num vergonhoso patamar dentre as nações civilizadas.

Mariella foi morta nas ruas do Rio, onde diariamente também tombam cidadãos de todas as  étnias, de todos os gêneros, todas as profissões, níveis culturais, e sociais. Crianças e jovens estão morrendo estupidamente, em tiroteios, entre marginais e policiais, ou entre grupos de traficantes rivais, quando não em bailes periféricos,como tomamos conhecimento a toda hora. Balas disparadas a esmo, buscam suas vítimas inocentes, ou não, onde quer que estejam. Quando essas vítimas sobrevivem, adquirem sequelas, inclusive psicológicas, para o resto das suas vidas, alimentando as estatísticas que não param de crescer. E a ninguém pode se julgar a salvo, pois o mal está se alastrando rapidamente, fruto da impunidade e da hipocrisia que reinam soberanas neste país do faz de conta.  E não há a quem apelar.