O CACAUEIRO NO CONTEXTO AGROECOLÓGICO
Luiz Ferreira da Silva, 85
Pesquisador aposentado da CEPLAC
(O cacaueiro, com seu manto protetor do solo. Foto. Cortizo)
O cacaueiro é um dos cultivos mais importantes na agricultura brasileira porque reúne a maior gama de funções do agronegócio, conforme Frederico Afonso reafirmava em suas palestras:
• Ecológica. O sistema de plantio do cacaueiro, com plantas consortes no início do seu estabelecimento, e sombreamento florestal em todo o ciclo, confere uma série de benefícios ao ambiente, como: (a) formação do microclima favorável à convivência equilibrada entre os seres vivos existentes no sistema; (b) manutenção de espécies florestais do ecossistema úmido tropical; (c) reciclagem eficiente de nutrientes advinda do cacaueiro e espécies associadas, minimizando a exploração de minerais pelas colheitas; e (d) contenção dos processos de erosão e de lixiviação dos nutrientes pela agregação da matéria orgânica , originada da cobertura contínua da superfície do solo pelas folhas que caducam durante todo o ano, formando um manto (“mulch”) na superfície do terreno, melhorando inclusive as condições físico-hídricas e o poder retentor de água pelo solo e reduzindo a evaporação.
• Alimentar. O chocolate, produto básico da industrialização do cacau, é um alimento de grande valor nutritivo e energético, de rápida metabolização e ótima digestibilidade por parte do organismo humano, agindo como antioxidante pela presença dos polifenóis e flavonoides. Nos países desenvolvidos, o chocolate faz parte da dieta cotidiana, ao lado das frutas, carnes, cereais e verduras. Seus três ingredientes – cacau, leite e açúcar – levam-no a ser considerado como um dos alimentos mais bem balanceados, devido ao teor de proteína, hidrato de carbono, gorduras, albuminas, caseína, sais minerais e vitaminas.
• Geradora de empregos. O cacau depende forte mente do trabalho do homem, mais do que da máquina. Tarefas que vão desde a roçagem, desbrota de “chupões, colheita e quebra dos frutos, fermentação e secagem, são feitas quase que exclusivamente pela mão do homem. Para a implantação de um hectare de cacau, demanda-se em torno de 300 jornadas de trabalho. Na manutenção da mesma área de cacaual safreiro, há uma necessidade de 80 jornadas por ano.
Modernamente, o pacote tecnológico vai demandar uma quantidade de mão de obra ainda maior e de melhor qualificação.
• Geradora de divisas. A cacauicultura nacional evoluiu da geração de divisas da ordem de U$ 50 milhões, como média no quinquênio 1960/65, para U$ 620 milhões, por ano, no período 1980/85. Nos anos de ouro do cacau e, particularmente, em 1979, o cacau contribuiu com o recorde de U$ 953 milhões, isso sem computar a produção destinada ao mercado interno.
Com a crise dos últimos anos e a atual, a exportação brasileira de cacau vem se reduzindo continuamente, sem perspectivas de reversão a curto prazo.
Além do mais, a lavoura cacaueira, é formadora de bens patrimoniais por ser de natureza perene, exigente de construções e instalações para o processamento da produção e de imóveis habitacionais para os trabalhadores o que acaba imobilizando um montante de capital expressivo na fazenda. Isto dá um poder de garantia para levantamento de empréstimos, a juros módicos, facilitando a capitalização do produtor. No entanto, estes financiamentos podem ser um tiro no pé, dificultando a vida financeira dos mutuários, pela falta de educação financeira e capacidade de gerir recursos em busca de rentabilidade, ou seja, má aplicação dos recursos, como ressalta sempre o colega Moreau em seus escritos.
No Sul da Bahia, a importância do cacau se releva em razão das condições de trópicos úmidos, cuja lavoura se interage com o meio ambiente, notadamente solo e clima chuvoso, amainando as intempéries ambientas e desgastes dos terrenos.
Dessa forma, implantado em solos férteis, medianamente profundos, pedregosos, e de relevo fortemente ondulado e sob a floresta, aliado a cobertura do solo (“mulch”), proporciona proteção ao solo do impacto das gotas erosivas das chuvas, tanto acumulando húmus como melhorando as propriedades físicas do solo.
Em outra condição, na qual a visão é puramente economicista com a exploração do solo ao limite da sua produtividade, a denominada agricultura de precisão, perde-se essa característica agroambiental da lavoura.
Portanto, há que se medir os ganhos e perdas, não só centrando no estipendiário, como parece ser a concepção atual de se expandir para novos agrossistemas.