Anísio Cruz – 21 de março

Hoje quero pedir licença aos amigos, para prestar uma homenagem àquela que me trouxe ao mundo, num dia qualquer, de um janeiro lá do passado. Era conhecida por Leda, embora o seu nome fosse Edialeda, um anagrama do nome da sua avó paterna, Adelaide (minha bisavó, portanto), e veio ao mundo há 102 anos, no dia 21 de março de 1916. Meu avô, o velho Anysio Pereira, Escrivão de Aritaguá, gostava disso, e vários dos seus filhos tiveram os seus nomes de registro, aludindo a outro, ou a algum antepassado.

Viveu a sua infância, e juventude, no arrebalde do Iguape, onde também nasceram 10, dos seus irmãos, e apenas uma das minhas tias, Dejanira, a mais velha, nasceu em Salvador.  11 deles, homens. Ela e a sua irmã Belanísia (Bela), ajudavam à minha avó Leó na criação deles, na velha Fazenda Sto. Antônio, onde DEPOIS me deu a luz. Época de grandes labutas, e pouco tempo para lazer. Tempo do fifó, da lamparina, do fogão a lenha, dos banhos no ribeirão do Iguape, de onde voltavam com as latas d’água para abastecer as antigas talhas, e filtro de barro.

Um dia conheceu o meu pai, numa festa na casa de D. Amélia Sá (casa “mal assobrada” das lendas ilheenses), para onde fora em grupo, a pé, como era costume, acompanhado de alguns irmãos, já rapazes. Naquela época viajaram quase duas léguas, cortando caminho pelas matas do Bco. da Vitória, após atravessarem o ribeirão do Iguape, que hoje chamam de Itacanoeira. Depois disso, meu pai foi visitá-la muitas vezes, fazendo o percurso inverso, desde a Faz. Jcarecica (do outro lado do rio Cachoeira), até que resolveram casar, formar a família, e gerar a mim, e às minhas irmãs, Neyde, Maria Angélica e Maria das Graças.

Dona Leda sempre foi muito querida por quantos a conheceram. Seus irmãos a adoravam, e sempre estavam por perto, principalmente após a nossa mudança para a cidade, nos idos de 1954. Na antiga Conselheiro Saraiva (hoje Antônio Lavigne de Lemos), ali onde hoje existe a Galeria Bandeirante, moramos por 26 anos. A casa fervilhava com amigas das minhas irmãs, numa convivência harmônica, da qual nos ressentimos nos dias atuais, quando a individualidade prevalece. Fervorosa, fazia suas longas preces à frente do seu nicho, onde ficavam diversas imagens de santos, e seus livrinhos de orações. Guardo até hoje a sua imagem, contrita, orando antes de ir dormir, para acordar às 4:30 da manhã seguinte, e retomar a sua labuta diária para nos alimentar, e educar. Quantas vezes acordei à noite, e lá estava ela, com uma vela à mão, matando muriçocas que abundavam na velha Ilhéus. Cozinheira de “mão cheia”, deixava loucos os seus vizinhos, com o aroma das comidas que preparava com esmero, e sempre arranjava jeito de fazer um regalo a um, ou a outro mais próximo.

Um dia adoeceu. Foi para Salvador, em busca de um possível tratamento. Um ano entre as incertezas de que fomos tomados, até o seu retorno cheia de esperanças. Porém, a doença foi minando a sua resistência, e fragilizada, veio a óbito em agosto de 1983. 35 anos de saudades, que afloram hoje, data do seu aniversário, e com certeza permanecerão na minha memória, por todo o meu existir. Luz, paz, e o meu amor, D. Leda, esteja aonde estiver. Beijo.