Alfredo Amorim da Silveira em: “10TAQUES”
Transcrito do jornal “Correio de Ilhéus”
Edição de 9 de setembro de 1924
Barão de Macaúbas
O primeiro centenário do grande educador baiano
A Bahia, sempre fiel ao culto das suas tradições luminosas, comemora, hoje, o primeiro centenário do nascimento de um dos seus filhos mais notáveis e beneméritos, – o eminente pedagogo Dr. Abílio Cezar Borges, Barão de Macaúbas.
Figura máxima entre os preceptores do século XIX, em nossa Pátria, bem merece o Barão de Macaúbas as homenagens com que a posteridade reconhecida está a premiar os incomparáveis serviços que s.ex. prestou à sociedade brasileira, como um dos paladinos mais sinceros e prestigiosos da bendita cruzada da educação nacional.
E não sabemos de como mais eloquentemente lhe honrar a memória veneranda e lhe exaltar os subidos merecimentos, do que evocar, nesta data, em traços largos embora, a sua Vida exemplaríssima e a sua grande Obra de educador.
A vida
Filho de Miguel Borges de Carvalho e D. Mafalda Maria da Paixão, nasceu o Dr. Abílio Cezar Borges aos 9 de setembro de 1824, na vila de Minas do Rio de Contas, da então Província da Bahia.
Concluídos os estudos primários na mesma vila do seu nascimento, foi, em 1838, para a cidade do Salvador, onde fez em dois anos o curso de humanidades.
Por força de alteração em sua saúde, retirou-se para casa de seu pai, voltando, em 1841, para matricular-se no curso médico da Faculdade da Bahia.
Transferindo-se afinal para a Faculdade do Rio de Janeiro, aí fez o sexto ano, e recebeu o grau de doutor, em 1847, sendo premiado em várias cadeiras, mercê dos seus talentos e da sua aplicação aos estudos.
Ainda no curso acadêmico, fundou, em 1845, com alguns companheiros, o < < Instituto Literário da Bahia >>, do qual foi presidente, e contribuiu em muito para a criação da < < Academia Filomática >>, mantida pelos principais homens de letras do tempo.
Colaborou ativamente nos periódicos Crepúsculo, Arquivo Médico Brasileiro, Auxiliador da Indústria e Jornal do Comércio.
Depois de formado, regressou à Bahia, onde exerceu a clínica; investido, em 24 de março de 1856, das altas funções de Diretor Geral da Instrução Pública, desobrigou-se brilhantemente desse cargo durante dois anos, ao cabo dos quais solicitou a sua exoneração, e dedicou-se daí por diante exclusivamente ao ensino. Em 3 de fevereiro de 1858, fundou o Ginásio Baiano , em cuja direção esteve quatorze anos. Esse importante estabelecimento de ensino – escreve outro egrégio educador Baiano, o Dr. Carneiro Ribeiro – foi um viveiro de luz, que imortalizou o nome de seu benemérito fundador. Dali, daquele foco brilhante, partiram raios que fomentaram e incentivaram as letras em toda a então província da Bahia; tinha razão a cidade do Salvador de se ufanar de ter uma boa casa de educação, uma fonte límpida onde se podia bem abeberar a mocidade . Depois de várias viagens à Europa, onde estudou com afinco as questões pedagógicas, assenhoreando-se dos melhores e mais modernos métodos de ensino, resolveu procurar um campo mais vasto para aplicação dos processos que adotou, e assim, em 1871, fundou no Rio de Janeiro, um estabelecimento modelar, com a denominação de Colégio Abílio .
Em 1882, foi nomeado pelo Governo seu delegado no Congresso Pedagógico Internacional, que
se reuniu em Buenos Aires, tomando parte nas importantes questões debatidas. O Governo Imperial, que já o havia nomeado Barão de Macaúbas, concedeu-lhe por essa ocasião as honras de grandeza. Tendo imaginado um método de leitura, que denominou Leitura Universal, e convencido de que prestaria inestimável serviço à sua Pátria, abriu vários cursos públicos gratuitos. Por ocasião da Guerra do Paraguai, animou o espírito nacional, escrevendo nos jornais, e armou à sua custa o Batalhão dos ”Zuavos Baianos”, que tão heroicamente se bateu pela Pátria. Aos 7 de setembro de 1869, fundou, com outros, a Sociedade Libertadora 7 de Setembro, que tinha por órgão o Abolicionista, para defender a causa da emancipação dos escravos.
Publicou para uso dos seus discípulos, diversas obras didáticas.
Foi Cavalheiro da Ordem de Cristo, Comendador da Ordem da Rosa e da Ordem de S. Gregório
Magno de Roma, sócio do Instituto Histórico Brasileiro, e faleceu, no Rio de Janeiro, em 16 de janeiro de 1891, cercado da admiração e do respeito de toda a nação.
A obra do educador
Abílio Cezar Borges – diz o ilustre Dr. Homero Pires, numa formosa síntese da sua obra de educador – não soube de fadiga na faina gloriosa de educar e instruir a mocidade do seu tempo, da qual a mais brilhante falange lhe esteve sob a direção. Tinha a intuição dos problemas do ensino, o qual, antes de todos, fez seriado neste país, antecedendo assim de muitos anos a reforma inaugurada por Benjamim Constant, nos albores da era republicana. Foi ainda ele quem, valente e corajosamente, rompeu, a vencer o clamor dos misoneístas, dos obstinados opositores a todas as reformas, melhorias ou progressos, como a ordem até então seguida nos estudos de humanidades, e só ministrava noções de latim depois do percurso, pelo aluno, do francês, do inglês e da geografia. Desterrou do seu estabelecimento, a que não faltavam o estímulo, a disciplina e o respeito, os castigos físicos. Sempre em luta com o espírito de inadaptação ao progresso, mandava o estudante freqüentar a um só tempo, três e quatro materiais.
Antes que do português oficialmente se reclamasse exame final obrigatório, fez do nosso idioma cadeira autônoma no seu Ginásio, e dele exigia o respectivo exame. O colégio era, ao demais, verdadeira academia, onde, nos famigerados outeiros, os alunos diziam as suas composições, em versos e em prosa, cantando e recantando os grandes dias da Pátria e os assinalados sucessos dos fastos escolares. Ali se revelaram muitas vocações, muitas tendências latentes, ali lucilaram em lampejos matinais, anunciadores da grande luz solar irradiante.
Tal foi a obra inestimável do aureolado pedagogo, a quem o Correio de Ilhéus folga de render as suas melhores homenagens, neste primeiro centenário do seu nascimento.